sexta-feira, 24 de abril de 2015

A HORA DA TRAVESSIA

Taiasmin Ohnmacht
 
 
 
 

Andou apressada pela avenida, o caminho de sempre, todos os dias descer do ônibus no mesmo ponto e atravessar o mesmo cruzamento, mas as possiblidades de sexta a animavam; era final de tarde e ela já pensava na noite, saída com grupo de amigos.

Chegou à faixa de segurança assim que o sinal fechou para pedestres, o intenso movimento de veículos dava poucas esperanças de atravessar antes de uma nova mudança de sinal. Ela parou na calçada, olhando os carros que vinham de sua direita. Resignada com a espera familiar, observou um homem próximo que também aguardava para atravessar, parecia mais apressado, fazia menção com o corpo de precipitar-se em direção ao trânsito. Ela não via o rosto, mas observou-lhe o cabelo castanho e a linha bem feita do corte junto à nuca, o desenho dos ombros largos, as costas fortes, a calça larga ocultando os quadris. Ficou curiosa em ver o rosto dele, pensou em se esforçar para fazer isso quando chegassem ao outro lado da rua. Houve uma pausa no trafego de veículos e ele apressou o passo para atravessar a larga via, de modo quase automático, ela foi junto. No meio da rua, ele olhou para o outro lado, viu-a e sorriu. Consciente da imprudência, ele ainda falou, brincando:

─ Se morrermos, morreremos juntos!
 
Ela pensou que seria muito bom se desse a coincidência de encontrar com
 
 Foram enterrados em cemitérios diferentes.